quinta-feira, 8 de abril de 2010

QUE CEIA!



Quando falamos em ceia, é muito comum vir em nossa mente aquela imagem de uma ceia de natal. Uma mesa farta, muita cor e rodeada de amigos e gente feliz. Mas essa é uma cena que para nós até ficou comum. É mais uma comemoração que fazemos periodicamente. Contudo, quando penso na origem de tudo isso, sou obrigado pelos fatos históricos a me reportar ao que chamamos de a última ceia de Jesus. Fato que inspirou artistas em todo o mundo por ser considerado um acontecimento bastante peculiar. É justamente nesse cenário que desejo entrar.

Os discípulos de Jesus certamente já haviam sido avisados a respeito do que estaria para acontecer naqueles dias. Jesus havia predito sua morte e sacrifício, como parte do propósito de sua vinda, mas é claro que isso não é digerido facilmente. Pense bem, ninguém aceita fácil ou de forma natural que alguém sadio e em plenas condições de vida, no auge do seu vigor físico de repente comece a falar que vai morrer, e ainda mais, ser preso, torturado e martirizado antes disso até chegar ao cúmulo da humilhação humana na época, uma morte de cruz, até porque ele não tinha cometido até o momento nada que pudesse condená-lo a isso. Não. Eu estou certo que ninguém assimilou esse fato. A ficha definitivamente não havia caído.

O outro lado da história era Jesus, plenamente convicto da realidade dos fatos e acontecimentos que estavam por vir. Imaginem esse cenário. Jesus e os seu discípulos. Ele sabendo que seria sua ultima refeição e os discípulos não tão certos disso poderiam estar encarando isso como mais uma refeição. Parece pouca coisa mas há uma diferença fatal entre eles.

Deixando os discípulos de lado, afinal de contas era mais uma refeição mesmo. Vamos pensar um pouco no que Jesus poderia ter pensado. Isso para ser bem impessoal e não afirmar o que EU teria pensado.

Essa é minha ultima oportunidade de fazer uma refeição em minha vida. É justo que depois de tudo, ou antes de tudo já que a pior parte estaria por vir, eu tenha o direito de fazer algumas exigências: a) Posso me dar o direito de comer tudo sozinho e deixar todo mundo só olhando, afinal de contas, passei a vida inteira dividindo tudo com essa gente, eles terão outras chances e eu preciso estar bem alimentado para suportar o dia difícil que terei; b) Posso exigir ficar sozinho nesse tempo, ou escolher outras pessoas para me acompanhar, afinal de contas em meio a esses discípulos tem na melhor das hipóteses um traidor, um covarde e os melhores que sobram são no mínimo medrosos e omissos pois vão me deixar sozinho o tempo todo.

É claro que poderíamos passar muito tempo imaginando o que faríamos em uma situação igual, mas a grande diferença é que o homem em questão era Jesus, que se fez homem igual a nós e foi encontrado dessa forma (Fil 2) e esse fato faz toda a diferença. Diante da possibilidade de transformar aquela refeição em um festival gastronômico de glutonaria e desperdício, até aceitável devido as circunstâncias, ele cumpriu o seu papel de mestre e nos deixou uma lição. O sentido da ceia, mais tarde chamada por Paulo de a Ceia do Senhor (1 Cor 11). Refeição podemos fazer sozinhos, buscando satisfazer nossas necessidades mais primitivas, mas a Ceia do Senhor só pode ser realizada em grupo, pois o seu fundamento reside no compartilhar o mesmo pão e beber do mesmo vinho. A natureza de Cristo nunca permitiria que ele se desse ao direito de se fartar sozinho, mesmo que esse pão custe a sua carne e esse vinho seja o seu próprio sangue. A maior de todas as ceias estava por acontecer e a grande mesa seria posta verticalmente em forma de cruz lá na sala chamada calvário. Ali sim, Jesus estaria sozinho, pois seria o sacrifício de um em favor de muitos.

Estar cercado de gente é vital para quem é amor em sua essência, mesmo que essas pessoas não sejam o melhor padrão de moral e virtude, ou melhor, pensando como Cristo, talvez esses sejam os mais indicados para estarem em sua companhia dando total sentido ao paradoxo da cruz.

A satisfação da ceia não é sair completamente saciado desconsiderando alguns que nada comeram (1 Cor 11). Mas sim, ter a certeza de que não comemos tudo mas que todos participaram do mesmo pão. Sair realizado por ter sido partido contradiz o sentido natural de segurança que busca na preservação individual a condição de satisfação.

Na ultima refeição da vida, Jesus se satisfez partindo o pão que poderia ser só dele. Podemos entender melhor o que aconteceu em João 4 quando Jesus com fome e sede, ao ser convidado para comer nos ensinou que sua alimentação consistia em fazer a vontade do Pai. O propósito de Deus e o compromisso com o seu Reino mais uma vez salta na lista de prioridades de Jesus, gritando aos nossos ouvidos que devemos fazer o mesmo.

A ceia do Senhor. Uma refeição simples, mas com um sentido eterno. Cercado de pessoas comuns e imperfeitas Jesus mostrou que o reino de Deus não é comida nem bebida, mas paz, alegria e justiça. Que se desejamos estar prontos para tomar a nossa cruz e segui-lo até o fim, não precisaremos estar de barriga cheia. Só basta ter a convicção de que nossa ceia foi bem repartida e compartilhada com todos, mesmos os que temos certeza que não merecem.

Quando penso que eu faria totalmente diferente, me alegro porque Jesus soube administrar de forma cristã esse momento. Tiro meu foco do evento, da refeição, da cerimônia, e quando celebro a Ceia do Senhor na congregação com meus irmãos lembro como Jesus viveu aquele momento e tenho que exclamar... QUE CEIA!

Miguel Levy

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